Faca campeira Don Cassio Selaimen



O porto-alegrense Cássio Selaimen viu em uma das atividades do pai, seu Omar, que também lida com o ramo imobiliário, sua profissão. “Meu pai além de lidar com a imobiliária é dentista clínico – o que, aliás, pratica até hoje. Eu escolhi seguir um caminho diferente e me especializei em ortodontia” conta ele, que depois de formado pela Ufrgs foi morar no interior paulista. Foram cerca de 6 anos em Araraquara, onde fez seu Mestrado e Doutorado, intercalando com alguns cursos de especialização nos Estados Unidos. “Ficava nesse ir-e-vir constante mas ligado em Porto Alegre, de onde sempre senti saudade” revela Cássio. No final dos anos 90, retorna à capital gaúcha e começa a lecionar no curso de graduação da Ulbra e em cursos e eventos da Associação Brasileira de Odontologia. No meio tempo, ainda, inaugurava sua primeira clínica particular. “Depois de algum tempo resolvi mudar, larguei as aulas e comecei a planejar algo que unisse minhas experiências” conta Cássio, que abriria em 2002 sua segunda clínica, um misto de consultório com escola de ortodontia na zona norte da capital.

Um belo dia, Cássio é convidado para dar um curso em Pelotas, de onde guardava muito boas lembranças de sua infância e adolescência, das visitas à fazenda do tio Fuad Selaimen, em Herval. “Passava minhas férias lá, acho que foi onde eu aprendi a gostar de campo”, revela. Durante os dias do curso, reencontrou antigos conhecidos, grandes amizades que há muito não tinha notícia. O reecontro despertou a saudade daquele tempo e, principalmente, daquele jeito de viver. “Me dava muito bem como todos, um pessoal simples, mas muito amigo” lembra Cássio, que até herança recebeu por conta das amizades que fez no campo. “Um capataz lá da fazenda do meu tio me deixou um monte de coisa, revólver, arreios, um poncho…”, conta, sorrindo. À época, cansado com a agitação e tensão do seu dia-a-dia, Cássio Selaimen queria mudar, “fugir” para um outro meio, outro ambiente. O reencontro com as memórias de infância foi decisivo, e em seguida o Rio Grande ganharia mais um crioulista.

O contato com o Crioulo começou em remates da raça, onde Cássio conheceu muita gente e começou a se enturmar. “Já quis começar com cavalos de prova, animais de competição, pois queria botar para correr, que é minha grande curtição”, conta. Foi em um remate da Cabanha Amaral que ele adquiriu Delegado do Garrucho, que já estava classificado para a final do Freio de ouro de 2002. “Já entrei na raça direto no evento maior, foi uma emoção indescritível estar lá, lado-a-lado com aquela gente toda que eu conhecia de nome e cujo trabalho eu admirava” lembra Cássio, que naquele momento já havia se tornado crioulista de coração. “Depois disso que me bateu a vontade de criar, daí procurei alguns conselhos e fui começando, devagarinho…”, revela. Um dos que o ajudou na escolha foi o médico-veterinário Rodrigo Py, de quem Cássio se tornou grande amigo. Tanto que é na fazenda Capão Redondo, em Barra do Ribeiro, de propriedade da família Py, que ele cria seus cerca de 20 exemplares hoje em dia.

“Mas, tu sabes, o cavalo Crioulo vem com um kit” explica Cássio, quando perguntado sobre o hobby predileto. Do contato com o cavalo e seu mundo, Cássio Selaimen começa a pegar gosto e querer aprender mais sobre outras coisas, como arreios, pilchas e… facas. “Sou muito detalhista, acho que é pela profissão, então sempre procuro ler sobre tudo que me interessa” conta, dizendo que se apaixonou pela arte da cutelaria e trabalhou durante dois anos até terminar sua primeira faca, em 2004. “Daí em diante me interessei demais, comecei a pegar o jeito e a coisa foi indo” diz Cássio, que tem como regra não vender suas facas. “É algo que faço por paixão, não tem preço que pague”, completa. A paixão cresceu e ocupou lugar na casa de Cássio – uma oficina equipada com as mais diversas ferramentas e que já passou por três reconstruções até ficar do seu jeito. “É um hobby complicado, pois no Brasil não é muito difundido. Lá fora se compra tudo para montar uma oficina em uma loja no shopping, aqui tem de se adaptar e montar tudo, peça a peça”, conta.

Hoje, Cássio leva em média de 4 a 5 meses para terminar uma faca. Todo o trabalho é artesanal e prima pela rusticidade. “Existem algumas partes perigosas deste trabalho, como o acabamento e o polimento, que eu não faço, pois não posso correr o risco de um acidente com as mãos” lembra o dentista. O resultado é o que ele chama de “faca gaúcha”, uma faca mais rústica, mas que tem muitos admiradores. “Tem gente que gosta de ver a faca ‘martelada’, com a marca do trabalho do cuteleiro”, conta. Um dos fãs é o músico e compositor Elton Saldanha, que conheceu Cássio em um jantar com amigos no final de 2004 e ficou encantado com o trabalho. “Quando ele me pediu uma faca, disse que queria me pagar, e coisa e tal, mas não aceitei – foi quando resolvemos fazer uma permuta”, diz. Em pagamento pela faca, Elton fez uma música especialmente para o novo amigo e a incluiu em um de seus álbuns. No outono seguinte, Elton retorna à casa de Cássio com um amigo que também havia se apaixonado pelo trabalho: o tradicionalista Nico Fagundes. “Nico conheceu o aço damasco (composto por dois ou mais tipos de aço diferentes) e quis uma faca dele” explica Casio – um dos poucos que fazem esse tipo de trabalho no Brasil. Faca pronta, eis que a emoção bate forte no peito de Seliamen quando vê o “pagamento” de Nico: uma bela poesia sobre o mais novo amigo. “A maior alegria de todas é ver esse carinho e respeito que vêm dos amigos”, completa.

Fonte: http://doncassioselaimen.com.br/

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